Bruno de Cerqueira*
o
A terrível crise económica e
política por que passa a pátria-mãe lusa dos brasileiros faz reacender
em muitos ambientes a discussão sobre a restauração – ou reinstalação,
para os que não partilham de uma visão passadista – da monarquia
portuguesa, na figura do chefe da Casa Real e, de jure,
dinasticamente, Rei D. Duarte III de Portugal, conhecido em todo o país
como Duque de Bragança, um dos muitos títulos que possui D. Duarte Pio,
nascido em 1945, na Suíça, quando a lei de banimento dos Bragança ainda imperava na República Portuguesa…
D. Duarte Pio João Miguel
Gabriel Rafael de Bragança e Orleães e Bragança, afilhado de baptismo do
Papa Pio XII (1876-1958), é o primogénito de D. Duarte Nuno (1907-1976),
Duque de Bragança e neto e sucessor de D. Miguel I, o desditoso irmão
de nosso D. Pedro I, e de D. Maria Francisca (1914-1968), nascida
princesa de Orleães-e-Bragança, neta da Redentora.
Ele casou-se na festa de Nossa
Senhora de Fátima, em 13 de maio de 1995, em uma mega-evento
televisionado para Portugal e quase todos os países lusófonos, no
Mosteiro dos Jerónimos, com a nobre portuguesa D. Isabel Inês de Castro
Curvello de Herédia, da Casa dos Viscondes de Ribeira Brava, uma
linhagem de administradores dos territórios insulares portugueses de
Açores e Madeira. O casal (Casal Real para os portugueses ditos
“monárquicos”) gerou os almejados três herdeiros da Coroa: o Príncipe da
Beira, D. Afonso de Santa Maria (1996), a Infanta D. Maria Francisca
Isabel (1997) e o Infante D. Dinis de Santa Maria (1999).
D. Duarte, um bisneto de D.
Isabel I que costuma definir Portugal como sua “pátria” e o Brasil como
sua “mátria”, goza de uma estima considerável entre os habitantes do
outrora Reino de Portugal e Algarves e seus antigos domínios coloniais,
aí incluindo nosso País. Desde adolescente, ele visitou o Brasil
inúmeras vezes, conheceu a Amazónia, encontrou e travou contacto com
muitas tribos indígenas; nesse ínterim, é válido salientar que ele e seu
primo-irmão brasileiro, D. João Henrique, têm o espírito do avô, D.
Pedro de Alcântara (1875-1940) e do tio-avô, D. Luiz (1878-1920), que
adoravam as viagens, as expedições, os desbravamentos.
Pois bem, em 5 de Outubro de
2012 as autoridades portuguesas celebraram os 102 anos da proclamação de
sua República, sem manifestações populares. A República Portuguesa,
quando foi proclamada, em 1910, depôs D. Manuel II (1889-1932), jovem
rei alçado ao trono pelo assassinato de seu pai e seu irmão no famoso
Regicídio do Terreiro do Paço, em Lisboa, dois anos antes. Até hoje essa
incruenta passagem da história lusa produz em poetas e escritores
portugueses pró ou contra a monarquia textos candentes. A comemoração
republicana exibiu cenas inusitadas: o Presidente Cavaco Silva empunhou a
bandeira nacional de cabeça para baixo na Câmara Municipal de Lisboa e
uma desempregada em pânico invadiu a festa e protestou contra a crise
que assola o país. Tudo isso assistido por menos de 40 populares… (http://www.ionline.pt/portugal/5-outubro-cerimonia-marcada-bandeira-hasteada-ao-contrario).
O último Bragança-Saxónia-Coburgo-Gotha
reinante em Portugal, D. Manuel II, morreu sem descendência em seu
exílio inglês e parece ter deixado claro que os direitos dinásticos ao
trono passariam ao ramo “miguelista” da Casa de Bragança, na pessoa de
seu primo-sobrinho, D. Duarte Nuno, já citado. Casando-se com a prima
brasileira (do ramo “constitucionalista” dos Bragança) em 1942,
na catedral petropolitana (da cidade de Petrópolis), e dela gerando três filhos, D. Duarte Nuno
afirmou-se como rei titular da quase totalidade dos monárquicos
portugueses. Ele morreu em Dezembro de 1976 e seu filho, igualmente D.
Duarte, tornou-se o chefe da Casa e king-to-be.
O príncipe serviu como piloto
da Força Aérea Portuguesa em Angola entre 1968 e 1971, diplomou-se em
agronomia em Lisboa e cursou a pós-graduação de Desenvolvimento Económico da Universidade de Genebra. Se um plebiscito for proposto em
Portugal para decidir se quer ou não D. Duarte como chefe de Estado
vitalício e hereditário pode ser que algo surpreendente destitua o stablishment português e o mundo ouça falar em “volta da monarquia”, como se deu no Cambodja, em 1993.
Na festa republicana acima
citada, ao tempo em que o Presidente Cavaco Silva falava aos políticos,
D. Duarte de Bragança falava a centenas de monárquicos, no Palácio da
Independência (antiga sede da Casa de Almada); leu um manifesto à Nação,
em que critica duramente os sucessivos governos que têm administrado
Portugal no parlamentarismo da “III República Portuguesa” (1974- ),
considerando muitos de seus mandatários como irresponsáveis e corruptos.
Aos analistas internacionais,
em geral bem despreocupados com o assunto, fica a dica: acompanhem mais
de perto os sucessos de D. Duarte e seus seguidores…
Passando ao outro extremo
europeu, vamos para o leste, mais precisamente os Balcãs, terra de
deliciosas paisagens, mas também de terríveis histórias bélicas. O
antigo “barril de pólvora” da Europa está hoje bem mais pacificado, com
seus povos tentando, a duras penas, o soerguimento e a reconstrução
nacional. Do outrora Reino da Jugoslávia (literalmente, terra dos
eslavos do sul), resta hoje apenas a República da Sérvia, país cuja
dinastia nacional (a Casa de Karadjordjevic, ou seja, os descendentes
do herói Karadjordje) forjou esse Estado entre o XIX e o XX,
aproveitando-se do fim dos Impérios Turco-Otomano e Austro-húngaro na I
Guerra Mundial. As actuais repúblicas da Croácia, da Macedónia, da Eslovénia e, por fim, do Montenegro, todas promoveram a secessão do
antigo estado dos Karadjordjevic que foi mantido durante os
anos de comunismo (1946-1989) com a mão de aço do Marechal Josip Broz
Tito (1892-1980), um socialista considerado “lhano” perto de seus
vizinhos sanguinários da Cortina de Ferro. Isto sem falar da
Bósnia-Herzegovina, hoje uma federação independente, mas de triste
memória – sua capital, Sarajevo, foi palco do estopim da I Grande Guerra
e de lutas fratricidas no anos 1990.
Em 1991, o herdeiro do trono
sérvio, Aleksandar Karadjordjevic, nascido em 1945 em uma suite do hotel
londrino Claridge´s, declarada especialmente território jugoslavo pelo
Governo Britânico (princípio da extraterritorialidade), finalmente pisou
o solo de Belgrado, para ele e sua família considerado sagrado.
Conhecido como Aleksandar II, desde que seu pai morreu no exílio, em
Illinois (EUA), é pentaneto de D. Pedro I, uma vez que sua avó paterna, a
Rainha Marija (1900-1961), nascida princesa da Roménia, era neta da
Infanta D. Antónia de Portugal, filha de D. Maria II…
O príncipe – em linguagem
técnica de genealogia dinástica “Sua Alteza Real o Augusto Senhor
Aleksandar, Príncipe-Chefe da Casa Real da Sérvia etc.” – é o filho e
sucessor do Rei Petar II da Jugoslávia (1923-1970), um afilhado de baptismo do rei britânico George V (1865-1936), que não pôde contar com a
ajuda das tropas do Reino Unido quando da deposição e do banimento, ao
término da II Guerra Mundial. Ainda assim, ele exilou-se em Londres,
onde nasceu-lhe o filho, que foi baptizado por ninguém menos que o Rei
George VI e sua filha-herdeira, Princesa Isabel, na Abadia de
Westminster. O vídeo desse baptizado histórico pode ser visionado na
página oficial da dinastia real sérvia (www.royalfamily.org).
Aleksandar teve uma infância
complexa, visto que sua mãe, a Rainha Aleksandra (1921-1993), nascida
princesa da Grécia e da Dinamarca, era instável emocionalmente. Foi
criado pela avó Marija e enviado ao internato suíço Le Rosey. Depois, recebeu ampla formação militar na academia norte-americana de Culver e na britânica Mons Office Cadet School.
Da parte de sua “royal godmother” recebeu sempre bastante afeição e,
por este motivo, esteve presente em todos os eventos da Família Real
britânica, sobretudo no período em que viveu em Londres. Isto inclui,
óbvio, ter assistido ao enlace do Príncipe de Gales com Lady Diana Spencer, tanto quanto ao mais recente, do Príncipe William com Miss Kate Middleton.
Casou-se em 1972, no palácio de Villamanrique de la Condesa,
próximo de Sevilha, na Espanha, com a Princesa D. Maria da Glória de Orleães-e-Bragança, nascida em Petrópolis em 1946. O príncipe, que se
estabeleceu como empresário nos Estados Unidos e na Espanha, chegou a
passar temporadas em Petrópolis e no Rio de Janeiro.
Ele e D. Maria da Glória
tiveram três filhos: o herdeiro, Petar (1980) e os gémeos Filip e
Aleksandar (1982). De maneira que esses três príncipes da Sérvia são
trinetos da Redentora e duplamente descendentes de D. Pedro I. Se o mais
velho deles vier um dia a ser rei, será chamado de “Petar III”, o que
significa “Pedro III da Sérvia”…
Divorciando-se de D. Maria da
Glória em 1985, ambos anularam o casamento: ele obteve do Patriarca da
Igreja Ortodoxa Sérvia a anulação e ela da Sacra Rota Romana.
Aleksandar II uniu-se à cidadã
grega Katherine Batis, filha do mega-empresário Robert Batis, mas não
gerou filhos. A princesa brasileira desposou D. Ignacio de Medina y
Fernandez de Córdoba, duque de Segorbe etc., um dos filhos da Duquesa de
Medinacelli, D. Victoria Eugenia de Fernandez de Córdoba y Fernandez
de Henestrosa. A Casa de Medinacelli é a dinastia ducal-principesca
espanhola que, juntamente com a Casa de Alba, constitui a mais alta
classe sócio-genealógica do país, directamente abaixo da Casa Real
(dinastia Borbón, ou Bourbon, no original francês).
Após a queda de Slobodan
Milosevic (1941-2006), em Outubro de 2000, os ventos democráticos
proporcionaram aos príncipes da Sérvia não somente retornar em
definitivo ao país, como advogar no Judiciário nacional o retorno de
suas propriedades, confiscadas pelos comunistas em 1947. O antigo
palácio real de Belgrado (chamado de “Palácio Branco”) e outras casas
foram devolvidos aos Karadjordjevic, que residem oficialmente na capital desde Julho de 2001.
A família trabalha
incessantemente pela instalação da monarquia constitucional-parlamentar
no país. Aleksandar II e sua consorte, Princesa Katherine, usam de forma
profícua a networking que construíram ao longo dos anos; os jovens príncipes, desportistas e guapos, fazem grande sucesso entre os jovens.
Em 4 de Outubro de 2012, os Karadjordjevic
conseguiram fazer com que o governo da Sérvia repatriasse os restos
mortais do Príncipe Pavle (1893-1976) e de sua mulher, Olga (1903-1997),
nascida princesa da Grécia e da Dinamarca. O Príncipe Pavle da Jugoslávia foi o regente do Reino na menoridade do primo, Petar II, de Outubro de 1934 a Março de 1941. As cerimónias de Estado foram
co-presididas pelo Presidente da República, Tomislav Nicolic, e o
Príncipe Aleksandar, cabendo a condução dos ofícios sacros ao Patriarca
Irinej I, supremo líder dos ortodoxos sérvios e um filo-monarquista
declarado…
É curioso notar que tanto em
Portugal, quanto na Sérvia, as bandeiras nacionais restauraram os
antigos brasões reais há mais de uma década. Pesquisas de opinião
recentes mostram aumento significativo de simpatia pelo parlamentarismo
monárquico em ambos os pequenos Estados.
Uma fina ironia perpassa a
possibilidade desses "Orleães e Bragança” de Portugal e da Sérvia
retornarem ao poder. Eles pertencem ao que a imprensa brasileira chama
de “ramo de Petrópolis da família imperial brasileira”. D. Duarte é o
sobrinho e os meninos Petar, Filip e Aleksandar os netos do falecido D.
Pedro Gastão (1913-2007), príncipe-titular de Orleães-e-Bragança.
No Brasil, o ramo de D. Pedro
Gastão e o ramo de D. Pedro Henrique (1909-1981) permanecem separados e o
monarquismo certamente não é suficiente para uni-los. As causas de
desunião são antigas e não dizem respeito, como muitos pensam e dizem, a
direitos dinásticos. Trata-se do problema da herança das propriedades
petropolitanas (da cidade de Petrópolis) de D. Isabel.
Em 1946, o príncipe-chefe da
Casa Imperial do Brasil, D. Pedro Henrique, perdeu para seu primo a
causa em que defendia a anulação do negócio jurídico de venda das acções
da Companhia Imobiliária de Petrópolis durante a II Guerra Mundial;
advogou para ele o renomado civilista carioca Carlos de Saboia Bandeira
de Mello (1890-1963). Contudo, a Justiça do Rio de Janeiro deu ganho de
causa a D. Pedro Gastão e desde então a briga entre eles jamais cessou.
Pois a contenda girava em torno do laudêmio resultante da enfiteuse
do Centro Histórico de Petrópolis, cujos dividendos vão exclusivamente
para o ramo primogénito de D. Isabel, enquanto o ramo secundogénito,
especificamente a família de D. Pedro Henrique e D. Maria da Baviera
(1914-2011), ficou em situação de quase-penúria. A irmã de D. Pedro
Henrique, D. Pia Maria (1913-2000), casada com o conde francês René de
Nicolaÿ, nunca passou apertos.
A questão é complexa e não se
restringe a uma história de “mocinhos” e “bandidos”. Para aumentar as
desavenças, acresceu-se a vontade manifesta por D. Pedro Gastão, durante
toda sua vida, de negar o ato de renúncia ao trono assinado em 1908
pelo primogénito de D. Isabel, seu pai.
Por desejarem, D. Isabel e o
marido, que seu herdeiro se unisse a uma moça de “família régia”, i.e.,
uma casa principesca reinante ou ex-reinante, eles convenceram D. Pedro
de Alcântara a renunciar aos seus direitos sucessórios, no que
concernisse ao Brasil, passando-os a D. Luiz. Na recente biografia deste
príncipe, a historiadora Paulista Teresa Malatian explicita que a
renúncia não se deve exclusivamente a factores genealógico-dinásticos,
pois D. Luiz tinha muito mais interesse numa eventual restauração
monárquica brasileira do que D. Pedro. Este, contudo, se sentia muito
brasileiro e sofria com os desejos do pai, que o manietava no sentido de
se assumir como “Príncipe Pierre de Orleans” e futuro “Conde de Eu”.
A união de Isabel, princesa de Bragança e Gaston, príncipe de Orleães, celebrada em 15 de Outubro de 1864, deu origem à Casa de Orleães-e-Bragança,
que teria sinonímia com a Casa Imperial do Brasil se o casal tivesse
reinado como D. Isabel I e D. Gastão (imperador-consorte) e o primogénito de ambos (D. Pedro) tivesse se tornado D. Pedro III. Nada
disso ocorreu.
Em 1908, após assinar a
renúncia por si e os eventuais descendentes, D. Pedro casou-se com a
Condessa Elisabeth Dobrzenska de Dobrzenicz (do Reino da Bohêmia,
império habsbúrgico) e seu irmão-herdeiro, D. Luiz, desposou a Princesa
D. Maria Pia das Duas Sicílias, princesa de Bourbon. Desses casamentos
nasceram cinco crianças, do primeiro, e três do segundo. Todos
receberam, na França, o nome civil de “Orléans-Bragance” ou “Orléans et
Bragance”.
Os oito netos da Redentora (D.
Pedro Henrique, D. Isabel, D. Luiz Gastão, D. Pedro Gastão, D. Pia
Maria, D. Francisca, D. João e D. Thereza) foram, todos, baptizados em cerimónias em que a brasilidade era exaltada, e às quais afluíam, na
medida do possível, os nobres brasileiros que viviam exilados em Paris e
na França. A todos se lhes reconhecia a condição de “Príncipes
Brasileiros nascidos no exílio”, ainda que nossa República negasse tal
pretensão. Não vou entrar nas minudências históricas da condição
genealógica desses príncipes; devo afirmar, contudo, que todos se
sentiam brasileiros, para além das outras identidades, mormente a
francesa, que puderam gozar e/ou partilhar no curso de suas vidas.
Nascidos em solo francês e trinetos do último rei do país
(Louis-Philippe I dos Franceses), os príncipes de Orleães-e-Bragança
eram bilingues desde o berço, falando Português e Francês todo o tempo.
Foram criados como verdadeiros
primos-irmãos, partilhando tudo, alegrias e tristezas. O destino
encarregou-se de torná-los pessoas distantes umas das outras, como
ocorre em muitas famílias numerosas e tradicionais…
No fim de 1921, estavam mortos
D. Isabel e dois de seus filhos: D. Luiz e D. António. Sobravam o velho
Conde d´Eu, alquebrado em anos, D. Pedro com mulher e filhos e D. Maria
Pia, viúva, com os filhos. No ano seguinte (1922) a Nação Brasileira
comemorou os 100 anos de sua independência e a família ex-reinante foi
convidada pelo governo da República a retornar ao solo pátrio e receber
as homenagens. Se o Conde d´Eu era o chefe daquela família de um ponto
de vista moral e de organização interna, era ao pequeno D. Pedro
Henrique, de 12 anos, que cabia a honrosa situação de “herdeiro da Coroa
e chefe da Casa Imperial”. Morto o Conde d´Eu em Agosto de 1922, em
Águas Brasileiras, suas exéquias constituíram aos pequenos Orleães e Bragança
que pisavam o Brasil pela primeira vez uma boa oportunidade de sentir o
calor humano das demonstrações de apreço popular àquela estimada
Família.
D. Pedro de Alcântara, com a
morte do pai, é o único príncipe adulto vivo. Ele retorna à França com
os despojos mortais de D. Gastão, a fim de enterrá-los no mausoléu dos Orleães,
na Capela Real de São Luís de Dreux, no Vale do Loire. Resoluto a
voltar a morar na sua querida Petrópolis, mas preso à França pelas
propriedades da família, o príncipe-titular de Orleães-e-Bragança — era
esse seu título genealógico, uma vez que não se casara morganaticamente,
que jamais renunciara ao nome de família e à primogenitura da linhagem
nascida do casamento de seus pais — inicia o longo processo de
inventário dos genitores. Ele fica com o Castelo de Eu e a viúva de D.
Luiz, sua cunhada, com o palacete de Boulogne-sur-Seine.
Embora senhor de Eu, D. Pedro
nunca quis solicitar ao primo, chefe da Casal Real da França, seu título
de “Conde d´Eu”, em prova cabal de que se sentia mais brasileiro do que
francês. Por outro lado, apesar de não esconder certa mágoa pela
renúncia ao trono praticada em 1908, nunca a negou. Respeitou a condição
do sobrinho e, enquanto viveu, aparou as eventuais arestas e rusgas que
podiam nascer do incómodo familiar.
Ele, a mulher e a cunhada
preocupavam-se com o futuro das crianças. Em 1931, ele casou sua primogénita justamente com o futuro herdeiro dos Orleães, o
Delfim de França, Henri (1908-1999), Conde de Paris. Após o faustoso
casamento, D. Pedro resolveu voltar ao Brasil e se instalar na antiga
“Casa dos Semanários”, ou seja, o palacete atrás da residência de verão
de D. Pedro II, em Petrópolis, que servia de pousada aos nobres que se
revezavam no “serviço do Paço”.
Embora não fosse, de um ponto
de vista dinástico, o “Príncipe do Grão-Pará”, título que a Constituição
do Império (art. 105) lhe garantiu no nascimento e pelo qual foi
conhecido e reverenciado durante todo o tempo em que vivera aqui, D.
Pedro, em clara demonstração mais afectiva do que racional, intitulou a
residência de “Palácio Grão-Pará”, nome pelo qual os petropolitanos
conhecem o prédio até hoje.
Viveu nesse solar da Região
Serrana fluminense até 1940, quando morreu. Na década de 1990, D. Pedro
Gastão trasladou para a Catedral de São Pedro de Alcântara os despojos
do pai, bem como os da mãe, D. Elisabeth, que morrera em Portugal, em
1951.
Se o “ramo de Petrópolis” pode
reconstituir o Reino de Portugal e o Reino da Sérvia, o “ramo de
Vassouras”, herdeiro do Império do Brasil, parece estar longe da
possibilidade de remonarquizar os brasileiros… Ainda assim, em Abril de 1993 o plebiscito previsto nas disposições transitórias da
Constituição de 1988 foi realizado e a monarquia parlamentar recebeu
cerca de 13% dos votos válidos, o que é um excelente resultado, dada a
ampla falta de conhecimento do que represente essa forma de governo nos
dias actuais, mesmo entre uma quantidade considerável de historiadores,
juristas e outros cientistas sociais.
Seja como for, estão todos, príncipes e
monarquistas brasileiros, rezando para que os sérvios e os portugueses
coroem Aleksandar II e D. Duarte III. Será que os céus atenderão suas
preces?
o
Bruno de Cerqueira (33) é historiador, monarcólogo, especialista em Relações Internacionais, professor de Cerimonial e Protocolo,
indigenista especializado (analista) da FUNAI e gestor do IDII.
indigenista especializado (analista) da FUNAI e gestor do IDII.
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