Muitos se interrogam acerca da razão
pela qual as palavras do Presidente da República não são escutadas ou
pior ainda, se tornam parte da gincana partidária, malbaratando-se assim
aquele princípio de equitativa distância que se supõe em qualquer
chefia de Estado. Pouco interessará se o utente do cadeirão presidencial
seja Soares, Sampaio ou Cavaco Silva, pois a constante confirma-se
sempre décadas sobre década e nem poderia ser de outra forma, dada a
base de legitimidade onde a instituição assenta.
Os conselhos jamais são escutados, a
conhecida fábula da magistratura de influência não passará disso mesmo,
de uma lenda tão nebulosa como a floresta de Birnam. Conhecem-se os
nomes de uma infinidade de amigos acumulados por uma "inexperiência
política" já anciã de mais de trinta anos, onde houve momentos bastante
azados para se tecerem redes de influência em todos os aspectos da vida
do Estado e sectores adjacentes da economia, finanças e imprensa. Em
suma, permanecerá sempre a desconfiança, aliás plenamente confirmada
pelo ridículo score eleitoral saído das últimas presidenciais,
somando-se ainda as iniludíveis responsabilidades pela desastrosa
"cooperação estratégica" que conduziu o nosso país ao abismo. Se
infelizmente não podemos dizer que se terão tratado das derradeiras
eleições ocorridas sob a forma de organização do Estado saído da longa e
permitida subversão e dos golpes de 1908 e 1910, nem por isso deixam de
estar bem evidentes as fragilidades e o completo descrédito da
instituição de todas as conspirações, conluios e recados de encomenda.
Em Espanha passa-se precisamente o oposto. O discurso que o Rei João Carlos
pronunciou há dois dias, consiste num claro repto lançado a toda a
sociedade espanhola e pelas reacções imediatas da chamada opinião
pública, atingiu plenamente os objectivos pretendidos, enumerando aquilo
que mais urgente há a fazer: a reabilitação da política no seu melhor
sentido. Essa política a que o Rei apela, deverá atender às prementes
necessidades da reforma do Estado saído do já longo período de transição
no qual a Coroa foi o elemento mais sólido, intransponível e coerente
na conformação do todo. O Rei há muito se apercebeu do perigoso resvalar
das reputações - inclusivamente da própria, sempre à mercê de críticas
justas ou absurdas -, pois estas, se encaradas de forma global, serão
aquele elemento incontornável e capaz de fazer ruir um sistema
laboriosamente trabalhado e que deu ao país um feliz período de paz,
progresso, justiça e tratamento equitativo sem paralelo na sua
história.
Sabemos o que em Portugal significaria
ter D. Duarte como Rei. Nada dado a frivolidades - talvez o único
argumento que os republicanos em Espanha aproveitam para atacar o Grande
Homem que é D. João Carlos -, perfeitamente consciente da situação de
Portugal no mundo e do seu percurso histórico que ainda lhe garante a
soberania, teríamos um monarca avesso a jogos partidários e às fáceis
cedências a uma anónima Europa que nos sufoca. O nosso país contaria com
o Rei decomprometido dos privados interesses que arruinaram Portugal e
ainda mais importante, alguém disponível para a aceitação de uma
profunda alteração da organização do Estado, prioridades sociais e a
imperiosa preservação daquilo que é intrinsecamente português. Em suma,
teríamos um supervisor da boa política, a única que interessa.
Sem essa política não existe a
democracia, por melhor rotulada que esta esteja. A boa política tem
muito a ver com o acerto das decisões atempada e cuidadosamente
ponderadas e como seria evidente num Portugal normalizado, gizadas para
um prolongado prazo que se medirá por décadas. As bases aí estão bem
sólidas desde há quase setecentos anos e nem sequer a passagem dos
séculos foi passível de uma grande alteração dos fundamentos da política
portuguesa na arena internacional. Disso o regime tem tido alguma
conta, mas de facto, os erros e as derivas têm sido catastroficamente
acumulados devido à ânsia do agradar de sectores onde a cacicagem impõe
cedências que muito prejudicaram o Estado e a sociedade civil. Não
existe má política que não tenha imediatos reflexos na educação, saúde,
defesa, economia, finanças e estabilidade social.
O Rei João Carlos impôs como metas o
respeito pelo outro, o desenhar de objectivos claros a longo prazo, a
lisura pessoal como essência do serviço público, a lealdade e também,
como o caso espanhol impõe sem subterfúgios, o reconhecimento da
pluralidade. Os sacrifícios de hoje, apenas terão razão de ser se
existir uma sólida perspectiva de reforma onde a justiça, a
simplificação do aparelho do Estado e a confiança nos agentes políticos
for garantida. Ora, no Portugal de hoje, tal parece ser uma tarefa
impossível, não existe o norte e nem sequer aquela carga simbólica que
uma certa instituição - independentemente da personalidade que no
momento a encarna - significa. Uma vez mais, os espanhóis estão em clara
vantagem.
Cavaco Silva poderia ter aguardado a ora
real e somente necessitaria de um bom tradutor para a pronunciar em bom
português, apenas mudando o nome do país. Apesar deste louvável
esforço, duvidamos do alcance que as palavras teriam nesta terrível
balbúrdia, nestes dias do fim que o regime ingloriamente enfrenta.
O Rei é o Rei. Gostaríamos que alguém
nisto que é e sempre foi a República, nos oferecesse uma confiança e
determinação comparável.
Publicado por Nuno Castelo-Branco, em Estado Sentido
Ainda bem que em Portugal ainda temos Rei: D.Duarte!! Que ele ocupe o seu legitimo lugar como Presidente da Républica! Que se inicie com ele uma nova era, um novo rumo, um novo futuro com esperança e rigor!
ResponderEliminarAtentamente,
Pedro Antunes