"(...) E, no entanto, aos nossos ouvidos soa a palavra triunfante: Rex
noster libert est. El-Rei é livre! E este é o segundo mandamento da
ideia, contrastante também com o segundo momento da imagem, que nos
daria um Rei preso por etiquetas, escravo de cortesãos ou do seu próprio
orgulho...
Quem libertou El-Rei? Quem lhe quebrou as grades do cativeiro? Deus e a História (a História, de que ele mesmo é agente).
Quem o cativou, agora o liberta. A servidão que El-Rei tem de cumprir; o
seu cativeiro e o seu serviço consistem em ser livre. É a ser livre que
Deus e a História o obrigam.
A sua liberdade nada tem que ver, no
entanto, com a sua condição de indivíduo. Livre, sim: porém, apenas como
sumário, síntese e imagem do Povo seu carcereiro. O grito de triunfo
Rex noster líber est só tem um sentido: significa exactamente o mesmo
que: Nos liberi sumus. El-Rei não é livre para si próprio. Não são os seus instintos, os seus desejos, as suas tendências de homem que se libertam. Ao contrário: tudo isso se encontra sujeitado.
Para uma coisa é livre, e então plenamente, exuberantemente,
loucamente: para que os seus súbditos possam afirmar, intrépidos: Nós
somos livres! É esta a liberdade real: a liberdade de que está cativo.
Tão forte prisão é esta liberdade, que basta ao Rei deixar de ser
livre para deixar de ser Rei. «O Rei é livre» é uma fórmula de
identidade. No dia em que a liberdade individual de El-Rei, sepultada na
régia existência, revoltando-se deixar de coincidir com a liberdade
colectiva (que é a própria liberdade de El-Rei enquanto Rei), o
rompimento será fatal. Fatal, porque automático. Um Rei não livre é,
ipso facto, um não-Rei. (...)"
Henrique Barrilaro Ruas, in "A Liberdade e El-Rei"
Henrique Barrilaro Ruas, in "A Liberdade e El-Rei"
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