Para
aqueles que passaram com menos que 12 valores nas aulas de história é
relativamente fácil perder-se o rasto a Henrique de Paiva Couceiro,
especialmente num registo de cem anos impenitentemente republicano,
republicanismo esse que ao próprio ofendia, e que ele combateu
praticamente até à data da sua morte. Não há amor perdido, aqui.
Relativamente
mais fácil é recordar que ele foi talvez dos elementos mais
instrumentais nas então chamadas “campanhas de pacificação da África
Oriental Portuguesa” em 1895. Foi ele, com a prestimosa assistência de
um punhado de oficiais portugueses e uma mistórdia de gente recrutada à
pressa, que na madrugada dum sábado, o dia 2 de Fevereiro de 1895,
segurou o quadrado de Marracuene, ali às portas da vulnerável Lourenço
Marques, contra um poderoso ataque de forças afectas ao Régulo
Gungunhana, criando o momentum que
culminou com a derrota de Gungunhana no fim desse ano, assegurando
assim no terreno o não menos importante mas certamente muito mais
perfumado, trabalho do governo português em Lisboa e de Luís Soveral em
Londres, assim permitindo que, oitenta anos depois, Moçambique viesse a
ter a geografia física e humana que ainda tem.
A vida de Henrique de Paiva Couceiro, no entanto, merece um estudo aparte.
Pois muitíssimo mais aconteceu que a sua algo fugaz (mas fulgurante, se algo subestimada) passagem por terras africanas.
Para
muitos, muito mais diz o seu combate e postura contra a primeira
república e o Estado Novo, em defesa do regresso ao regime monárquico.
Que mais não seja porque, enquanto muitos falavam e alegremente
comprometiam os seus princípios, ele manteve os mesmos princípios e fez
alguma – muita – coisa.
E eis que, oportunamente, surgiram dois eventos dignos de nota.
O
primeiro, é a generosa doação à nação portuguesa, por parte da Família
Paiva Couceiro, do seu espólio pessoal, cuidadosamente catalogado.
Ficará ao cuidado dos senhores da Torre do Tombo em Lisboa.
O segundo, não menos significativo, foi a publicação, da obra Paiva Couceiro – Diários, Correspondência e Escritos Dispersos (Lisboa: Publicações D.Quixote, 840 páginas, cerca de 32 euros).
Para
além de uma introdução por Miguel de Paiva Couceiro, seu neto, e que
viveu uns anos na Beira, saliento a preciosa coordenação e uma
introdução, pelo Professor Doutor Filipe Ribeiro de Meneses (adoro estes
títulos académicos portugueses), uma estrela que desponta entre uma
nova geração de historiadores portugueses, previamente autor de uma
muito badalada biografia de António Oliveira Salazar e cujas credenciais
académicas, rigor e boa escrita fazem pressupor que esta obra se vai
tornar numa das referências bibliográficas obrigatórias sobre esta
enigmática e fascinante figura das histórias de Portugal, de Moçambique e
de Angola nos séculos XIX e XX.
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