Pedro Santos Guerreiro |
O Presidente da República é uma majestade protegida. Há
uma deferência especial, começando na imprensa, que virá talvez do
reconhecimento de que o cargo tem sido um culminar agraciado de
carreiras políticas. É preciso cometer um grande erro para perder essa
imunidade. Esse erro é desrespeitar os portugueses. E Cavaco Silva
cometeu-o.
O Presidente da República é uma majestade protegida. Há uma
deferência especial, começando na imprensa, que virá talvez do
reconhecimento de que o cargo tem sido um culminar agraciado de
carreiras políticas. É preciso cometer um grande erro para perder essa
imunidade. Esse erro é desrespeitar os portugueses. E Cavaco Silvacometeu-o.
O valor da pensão de Cavaco Silva sempre o preocupou. Há um ano,
entre dois mandatos, o candidato Cavaco Silva lamentou-se publicamente
da pensão da sua mulher. É uma coisa que o incomoda. E compreende-se que
se lamente por não poder mais acumular salários com pensões; que as
veja cortadas por impostos; que as reveja diminuídas por cortes da
“troika”. A crise afecta todos os que têm rendimentos (muito mais do que
os que têm património) e mesmo quem ganha muito pode continuar a ganhar
muito mas só depois muito perder. Mas nada disto amnistia ou atenua
aquele desabafo de vão-de-escada. Porque é omisso e manipulador; porque é
de um Chefe de Estado; porque é de um privilegiado, mesmo que à custa
de transpiração. Portugal está hoje cheio de transpirados no desemprego,
de brilhantes a recibos verdes e de jovens promessas que não terão
pensões.
As misérias do Presidente da República não são misérias, são
privações. O desabafo do Presidente não é um desabafo, é uma zanga
incontida na semana em que recebeu a primeira reforma cortada, a de
Janeiro. Milhares de portugueses levaram essa chapada naquele dia. Não
precisavam de levar a segunda. Sendo pessoal, omissa em relação a outra
pensão e às despesas que não paga, é uma frase selectiva. Terá sido
afinal por razões pessoais que questionou a “equidade fiscal” destes
cortes apenas na Função Pública? Não podemos crer que sim, seria
demasiado mesquinho, o nível de impostos é mesmo de uma enorme
violência. Mas então por que razão não se levantou o Presidente contra a
falta de “equidade fiscal” noutras áreas, como o IRS de casados que
ganham se simulares divórcios?
Cavaco Silva quis fazer-se de mártir mas regou-se com gasolina.
Colocou a questão legal num prisma moral. A moral tem um inimigo no
moralismo. A República não pode ter um inimigo no Presidente. “Não sei
se ouviu bem, 1.300 euros por mês” é dos maiores insultos públicos dos
últimos meses aos portugueses. Custa muito pedir desculpa, mas é isso
que o Presidente deve fazer neste momento. A franqueza só é uma fraqueza
se a gente for fraca. E um “fraco rei faz fraca a forte gente”.
Que miséria, esta.
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