A conspiração da mentira e da morte na muito rendosa indústria do aborto
A muito puritana mulher do bispo anglicano de Worcester reagiu com indignação à hipótese evolucionista:
– Descender dos macacos!? Que horror! Esperemos que não seja verdade! Mas se for, pelo menos que não se saiba!
A reverendíssima
dama teve uma reacção digna de uma avestruz: este animal, talvez um dos
mais estúpidos do planeta, quando pressente um perigo, em vez de o
enfrentar, enterra a cabeça na areia.
A julgar pelas
novas práticas a seguir no atendimento das candidatas à interrupção
voluntária da gravidez, parece que a Inspecção-Geral das Actividades de
Saúde pretende que estas mulheres procedam do mesmo modo que as
avestruzes, ao jeito da consorte episcopal.
De facto, depois
da inspecção realizada, no ano passado, a vinte e dois estabelecimentos
que realizam abortos, por opção da mulher, até às dez semanas de
gravidez, essa entidade oficial recomendou agora que os «objectos
alusivos à infância, ou do foro religioso, sejam removidos dos
gabinetes médicos e de apoio psicológico e social, onde é prestado
atendimento a estas utentes». A retirada desses objectos foi exigida na medida em que os mesmos, segundo o mesmo relatório, podem «interferir com a escolha das utentes».
Como poderia ser
chocante para a candidata ao aborto saber a verdade, entende a dita
Inspecção-Geral que se deve evitar tudo o que, de algum modo, possa
revelar a verdadeira natureza do acto eufemísticamente designado como
interrupção voluntária da gravidez. Como? Pois bem, a grávida não deve
conhecer o resultado das ecografias, nem de qualquer outro exame médico
que comprove a certeza científica da vida humana que em si gera. Também
não deve saber que a «interrupção» da dita gravidez mais não é, na
realidade, do que o extermínio desse ente diminuto, mas já portador de
todas as características próprias do ser humano. Por isso, a sala em
que for recebida a desesperada mãe não deve ter «objectos alusivos à infância, ou do foro religioso», porque a sua presença poderia coagir emocionalmente a grávida, coarctando a sua liberdade de pôr termo à vida do seu filho.
Bem vistas as
coisas, as titulares do «direito» ao aborto nem sequer deveriam ser
atendidas por pessoas, na medida em que estas mais não são,
necessariamente, do que ex-crianças, que já foram portanto iguais ao ser
que agora se pretende eliminar. Além do mais, se se trata de um
competente e honesto profissional da saúde, como são quase todos os
médicos e enfermeiros, não poderá negar a vida humana do embrião, nem o
seu carácter pessoal, o que também pode ser perturbador para a infeliz
mãe. Assim sendo, o atendimento de grávidas nesta situação deveria ser
feito por máquinas de reposta automática, que ignorem a verdade que
não convém e sejam cúmplices da mentira que interessa afirmar.
Entende-se que,
nos gabinetes de atendimento médico e psicológico, é perniciosa a
presença de tudo o que possa ser entendido como alusivo à «infância».
Mas quem pode negar que, pela janela do consultório, se vejam bebés ao
colo das suas mães, ou se oiça o inocente riso de uma criança?! Para
evitar uma tal interferência, talvez seja de recomendar que as
consultas tenham lugar em salas subterrâneas, hermeticamente fechadas e
devidamente insonorizadas.
E, de que cor deveriam ser as paredes destas celas, se se interdita tudo o que seja, ou possa parecer, alusivo ao «foro religioso»?
Brancas não, pois é a cor que vestem as noivas no dia em que casam
pela Igreja, logo tem um claro sentido cristão. Azul é a cor do céu,
portanto apela para o transcendente e, por isso, deve ser também
rejeitado. Amarela é bandeira oficial do Vaticano, portanto também não é
uma cor admissível. Encarnado é o sangue e, portanto, poderia parecer
uma velada alusão ao carácter sangrento da interrupção voluntária da
gravidez. Um cor quente e alegre também não se compadece com a natureza
do acto a decidir em tal compartimento, uma vez que nenhuma insinuação
cromática deve perturbar a triste e fria determinação de quem o Estado
tão empenhadamente quer que aborte. Talvez só o preto se deva utilizar
nessa câmara ardente, cega e surda, em que só, diante de uma máquina, a
mulher poderá, finalmente, decidir «livremente» a interrupção voluntária da sua gravidez.
Num
tempo em que o Estado se empenha em dar uma exaustiva informação
sexual, que não educação, às crianças, não deixa de ser paradoxal esta
aposta na manipulação das mulheres, principais vítimas desta afectada
ignorância sobre o que a ciência afirma da vida em gestação e sobre as
implicações éticas e psicológicas do acto de abortar. O poder público,
ciente da natureza desse dramático desfecho, sabe que só uma mulher
enganada e desamparada poderá chegar a uma tão trágica determinação.
Pelos vistos, embora a Igreja tenha a fama de obscurantista, é o Estado
quem tem o proveito, como responsável por esta conspiração da mentira e
da morte na muito rendosa indústria do aborto.
Há dois mil anos, Jesus Cristo falou de alguém que é «homicida desde o princípio (…), mentiroso e pai da mentira» (Jo 8, 44). Ele é o «príncipe deste mundo» (Jo 12, 31). Nem mais.
P. Gonçalo Portocarrero de Almada